Políticas educacionais no Brasil
Falar sobre Política Educacional é tecer além da retórica como poderoso instrumento de intervenção social, é planejar ações voltadas para garantir o direito constitucional e subjetivo – a educação. Mas, as falas e as ações representam pensamentos, crenças, valores, necessidades (legais e institucionais), contradições e relações de poder.
O direito à educação no Brasil é garantido desde sua primeira Constituição (1824), mas asseguramos que somente pós-LDB/1996 é que o direito universal a educação se estabeleceu legalmente, muito embora, a LDB 5.692/71 já apontasse nessa direção mais democrática. A Lei de Diretrizes de Bases da Educação Brasileira além de ser a simbologia das Políticas Públicas em Educação, ela legitima atualmente uma das mais importantes ferramentas da Política Educacional em nosso país – o Plano Nacional de Educação (PNE vigência decenal).
E você caro estudante, o que percebe na relação entre a Política Educacional Brasileira e as demandas cotidianas no espaço da escola? Quais são as contribuições da LDB/96 para a educação do nosso país? Na prática, o Plano Nacional de Educação é um instrumento de ação estratégico real ou utópico?
POLÍTICAS PÚBLICAS: COMPREENDENDO SEUS PRINCÍPIOS
CONHECIMENTOS
Conhecer as concepções e os significados das Políticas Públicas como campo do conhecimento das Ciências Políticas, analisando o papel do Estado e as relações entre o que se pensa, se planeja e o que se executa.
HABILIDADES
Identificar que o processo de formulação das Políticas Públicas se traduz ao mesmo tempo em atitudes de governos e na análise dessas ações, para que se proponha estratégias de mudanças no decurso da execução da tomada de decisões.
ATITUDES
Refletir sobre a implementação das Políticas Públicas e sua relação com a autonomia relativa ao Estado (conflitos e limites de decisões), seu espaço e capacidade de atuação e, o momento histórico do país, bem como sobre a participação da sociedade civil na efetivação das políticas.
Os princípios das Políticas Públicas
O termo Políticas Públicas é binominal, por isso consideramos necessário expor o sentido de cada uma. Segundo a home page – significados.com.br – Política é a ciência da governança de um Estado ou Nação e também uma arte de negociação para compatibilizar interesses. O termo tem origem no grego politiká, uma derivação de polis que designa aquilo que é público. O significado de política é muito abrangente e está, em geral, relacionado com aquilo que diz respeito ao espaço público. Enquanto Pública, de origem latina publicus, se refere a povo (populus).
Disso, concluímos que Políticas Públicas é uma ação governamental para atender ao interesse do povo, e como a política é a arte da negociação, essas ações deveriam ser compartilhadas, pensadas e planejadas coletivamente com o povo. De acordo com Medeiros (2000, p.1), a “[…] área de políticas públicas consolidou na última metade do século XX um corpo teórico próprio e um instrumental analítico voltado para a compreensão de fenômenos de natureza político-administrativa […]”. Por isso, o autor indica que não há consenso com relação à definição do que seja política pública. Mas, de maneira geral, os conceitos usados são aqueles que definem tais políticas como ações do governo (SOUZA, 2006).
Conforme Souza (2006), a política pública é um campo de conhecimento da ciência política, que os governos, ao mesmo tempo em que agem, analisam suas ações para propor mudanças no curso das ações, ou seja, a formulação de políticas públicas traduzem propostas de eleição em programas, projetos, base de dados, sistemas de informações e pesquisas e se essas ações implementadas pelo governo darão resultados ou mudanças reais (submetidas a acompanhamento e avaliação).
Para essa autora, os cientistas, ao definir que as políticas públicas estão a serviço da resolução de problemas, se esquecem do “[…] aspecto conflituoso e os limites que cercam as decisões dos governos. Deixam também de fora possibilidades de cooperação que podem ocorrer entre os governos e outras instituições e grupos sociais” (SOUZA, 2006, p. 25). Por isso, as definições embora minimizadas, assumem uma visão mais holística da área, “[…] a política pública em geral e a política social em particular são campos multidisciplinares, e seu foco está nas explicações sobre a natureza da política pública e seus processos” (Souza, 2006, p. 25), além de repercutirem e inter-relacionarem com outras áreas do conhecimento como: economia, sociologia, ciência política, antropologia, geografia, ciências sociais aplicadas, planejamento e gestão.
A implementação das políticas públicas está mais relacionada à autonomia relativa do Estado, ao espaço de atuação (submetidas à influência externa e interna) deste, a sua capacidade de atuar e aos momentos históricos do país, do que com as pressões dos grupos de interesse, o elitismo ou classes sociais majoritárias.
Souza (2006, p. 36-37) aponta que:
A política pública permite distinguir entre o que o governo pretende fazer e o que, de fato, faz; […] envolve vários atores e níveis de decisão, embora seja materializada através dos governos, e não necessariamente se restringe a participantes formais, já que os informais são também importantes; […] é abrangente e não se limita a leis e regras; […] é uma ação intencional, com objetivos a serem alcançados; […] embora tenha impactos no curto prazo, é uma política de longo prazo. A política pública envolve processos subsequentes após sua decisão e proposição, ou seja, implica também implementação, execução e avaliação.
A política pública desejada deve ser planejada para promover as melhores escolas, o que de fato é preciso e necessário ser realizado, desde que, satisfaça o bem comum e esteja de acordo com legislação e as instituições e, sobretudo, seja uma política eficiente, norteada pelos princípios de planejamento, acompanhamento e avaliação.
Como pronunciado no início, para que as políticas públicas tenham o devido significado, seria necessária a participação popular e, atualmente, esta organização ganha foco através do neo-institucionalismo, ou seja, a participação das instituições para decidir, estabelecer e implementar tais políticas. Esse debate ganha repercussão porque as políticas públicas pedem intenção pública para a coletividade. Contudo, segundo Medeiros, 2000, p.2:
É preciso considerar que uma política pública pode ser elaborada pelo Estado ou por instituições privadas, desde que se refiram a “coisa pública”, por isso, as políticas públicas vão além das políticas governamentais, se considerarmos que o governo não é a única instituição a promover políticas públicas e, nesse caso, o que define uma política pública é o “problema público” (MEDEIROS, 2000, p. 2).
A partir dessa ideia, as políticas públicas não são apenas responsabilidade do governo, o autor apresenta um novo conceito, citando Volker Schneider (2005). Kenis e Schneider (1991) que utilizam a expressão “redes de políticas públicas” indicam a ideia de que os problemas, a discussão, a implementação e processamento político de uma dificuldade pública “não é mais um assunto exclusivo de uma hierarquia governamental e administrativa integrada, senão que se encontra em redes, nas quais estão envolvidas organizações tanto públicas quanto privadas” (SCHNEIDER, 2005, p. 37 apud MEDEIROS, 2000, p. 2). É necessário ver as políticas públicas a partir de parcerias, que possam contribuir com governos e Organizações Não Governamentais (ONGs) para buscar solucionar os problemas globais.
Numa visão operacional, as políticas públicas, segundo Saravia e Ferrarezi (2006), seriam uma tomada de decisão com vista a agir e omitir-se, prevenir ou corrigir, para manter ou mudar uma realidade de um ou muitos setores da sociedade, através de objetivos e estratégias de ação e alocação de recursos imprescindíveis para tornar exequíveis os fins propostos.
O processo de política pública não é racional, há em sua natureza uma desordem que afeta todos os partícipes: os que planejam, os executores e os beneficiários das políticas, porque ela própria é uma complexidade em si mesma e o Estado parece ter certa debilidade em executá-las. Na perspectiva de Saraiva e Ferrarezi (2006), a elaboração de políticas públicas seguem os seguintes passos:
- Agenda: diz respeito à escolha do problema a ser posto na agenda enquanto política pública (enquanto debate);
- Elaboração: trata da identificação (delimitação) do problema da comunidade, determinar suas alternativas de solução, avaliação de custos e efeitos e estabelecer prioridades;
- Formulação: consiste na seleção mais acertada da alternativa (tomada de decisão), definição de objetivos e seus fundamentos jurídicos, administrativos e financeiros;
- Implementação: consiste em planejar, organizar o Estado e seus recursos (todos viáveis e necessários) para executar a política;
- Execução: é por em prática a realização dos objetivos planejados;
- Acompanhamento: traduz-se numa sistemática supervisão da execução da atividade e objetiva fornecer dados para as possíveis correções;
- Avaliação: é a análise dos efeitos produzidos nos atores sociais pelas políticas públicas.
Vale sublinhar que as etapas descritas são mais uma operação teórica, do que se estabelece na prática, mas os procedimentos geralmente são os citados. Ademais, uma política pública está:
[…] integrada dentro do conjunto de políticas governamentais e constitui uma contribuição setorial para a busca do bem-estar coletivo […] As políticas públicas são influenciadas, a partir da sua incorporação ao elenco de ações setoriais do governo, pelas contingências que afetam a dinâmica estatal e pelas modificações que a teoria sofre como consequência. É por isso que, no começo, estão impregnadas pelas ideias vigentes em matéria de planejamento: fixação de metas quantitativas pelos organismos centrais de planejamento, geralmente dominados por técnicos mais ou menos esclarecidos; subordinação de toda a vida social ao crescimento econômico; determinação do futuro com base em projeções das tendências do passado (SARAVIA; FERRAREZI, 2006, p. 35).
Ao considerar a racionalidade técnica na elaboração das políticas públicas, os autores apontaram para o fato que esse aspecto influencia diretamente as decisões durante o planejamento. No entanto, Saravia e Ferrarezi (2006, p. 35) afirmam que “[…] o poder político dos diferentes setores da vida social e sua capacidade de articulação dentro do sistema político são os que realmente determinam as prioridades”.
Para entender o porquê das políticas públicas, é preciso compreender a importância das instituições políticas na formulação das proposições, pois delas “[…] emanam ou elas condicionam as principais decisões. Sua estrutura, seus quadros e sua cultura organizacional são elementos que configuram a política. As instituições impregnam as ações com seu estilo específico de atuação” (SARAVIA; FERRAREZI, 2006, p. 37). Dentro delas há forças tangenciais (indivíduos diversos) a sua estrutura racional e, muitas vezes, sujeitas a pressões do seu contexto social.
As Políticas Públicas consistem em ações tomadas pelo Estado que têm como objetivo atender aos diversos setores da sociedade civil. Muitas vezes, essas políticas são feitas com o apoio de ONGs ou empresas privadas.
Os tipos de Políticas Públicas: definindo suas características
As Políticas Públicas são “[…] ações geradas na esfera do Estado e que têm como objetivo atingir a sociedade como um todo ou partes dela” (SANTOS, 2016, p. 5), o autor indica que toda política pública tem uma intencionalidade, um/mais formulador(es) e um contexto (político, social, econômico e histórico). Por isso, Santos (2016) apresenta os quatros tipos de políticas públicas:
- Políticas Públicas Distributivas: são políticas amplas, concedidas ao povo de maneira consensual, através de bens, direitos ou poder, onde os recursos são distribuídos pelos Estado, os quais são arrecadados através de impostos. Exemplo: Sistema Único de Saúde (SUS).
- Políticas Públicas Redistributivas: são aquelas que objetivam “[…] redistribuir o acesso a recursos, direitos e/ou poder na sociedade, redefinindo, qualitativa e quantitativamente, mesmo que por via indireta, as relações de poder na sociedade” (SANTOS, 2016, p. 6). Essa redistribuição de acesso tende a ser conflituosa, polêmica e causar dissensos na sociedade, pois a reestruturação dos recursos rompe com o status anteriormente adquirido. Exemplo: as cotas para negros e afrodescendentes em universidades públicas.
- Políticas Públicas Regulatórias: é a conversão das políticas anteriores em leis e decretos. Essas políticas, como o próprio nome diz, regulam o acesso aos direitos, ou seja, ditam as regras e as normas do fazer políticas públicas. Exemplo: a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).
- Políticas Públicas Instituintes: são aquelas que determinam o regime político, a forma do estado e a maneira como este se apresenta composto. Exemplo: a Constituição Federal.
Santos (2006) apresenta um quadro-resumo das políticas públicas e as características de cada uma delas.
Tipos | Características | Exemplos |
Políticas Públicas Distributivas |
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Sistema Único de Saúde e e hospitais gratuitos. |
Políticas Públicas Redistributivas |
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Cotas para estudantes afrodescendentes em universidades públicas. |
Políticas Públicas Regulatórias |
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Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB). |
Políticas Públicas Instituintes |
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Constituição Federal. |
As Políticas Sociais: o espaço da Educação
O termo “política social” originou-se entre pensadores alemães em meados do século XIX, que inventaram, em 1873, uma associação para realizar estudos sobre esse tema. A partir disso, a expressão passou a ser amplamente empregada e, em algumas vezes, sem uma fundamentação conceitual.
Segundo Piana (2009), com a ascensão do capitalismo e a Revolução Industrial e as lutas das classes, essa movimentação trouxe o surgimento das políticas sociais, no entanto são percebidas como produto social, da relação entre os indivíduos de diferentes lugares, com interesses diversificados. A autora ainda explicita:
A política social surge no capitalismo com as mobilizações operárias e a partir do século XIX com o surgimento desses movimentos populares, é que ela é compreendida como estratégia governamental. Com a Revolução Industrial na Inglaterra, do século XVIII a meados do século XIX, esta trouxe consequências como a urbanização exacerbada, o crescimento da taxa de natalidade, fecunda o germe da consciência política e social, organizações proletárias, sindicatos, cooperativas na busca de conquistar o acolhimento público e as primeiras ações de política social. Ainda nesta recente sociedade industrial, inicia-se o conflito entre os interesses do capital e os do trabalho (PIANA, 2009, p. 23-24).
Piana (2009) ressalta que, o surgimento das políticas sociais não possui uma data de fato ou um momento particular. Elas surgem como resposta a Revolução Industrial e suas demandas de desigualdades sociais, sindicalização, urbanização, cooperativismo etc. Dessa forma, as lutas sociais e as mobilizações operárias no século XIX foram a demarcação da gênese da política social.
No entanto, para alguns outros autores, a política social, mesmo sem definição propriamente dita e de maneira geral, pertence às Ciências Sociais e é entendida como uma categoria de política pública, como uma atitude de governo, como preconizou Vianna (2002, p. 1):
Política social é um conceito que a literatura especializada não define precisamente. De um ângulo bem geral, no âmbito das Ciências Sociais, a política social é entendida como modalidade de política pública e, pois, como ação de governo com objetivos específicos. A definição parece óbvia e um tanto vaga. No entanto, contem duas armadilhas que, se desativadas, minimizam a obviedade e permitem alcançar maior precisão conceitual.
Ao dizer que existem “duas armadilhas” no conceito de político social, Vianna (2002) aponta para o fato da expressão “ações de governo” como a “primeira armadilha”, pois o termo é vazio e vem seguido da indispensável qualificação: que governo? Dessa forma, a política social como as políticas públicas são instituídas sob diversas estruturas legais e institucionais, em diferentes contextos, sistemas e regimes políticos, resultante de influências sociais (organizadas ou não, representativas ou não da sociedade como um todo). A autora ainda afirma que faz uma enorme diferença se a ação do governo é efetivada de forma tecnocrata, ditatorial ou com a participação popular. Se as ações governamentais são produzidas apenas pela elite dominante ou se é formulada abertamente por diversos setores sociais.
A “segunda armadilha” do conceito de política social apontada pela autora está relacionada à definição de política social como ação governamental com objetivos específicos, pois não esclarece por quem serão especificados os objetivos, em que esferas e com que legalidade. Dessa forma, Vianna (2002) indica que faz uma diferença se a determinação dos objetivos for apenas feita pelo governo (autoritária), e outra se for demarcada de maneira democrática (com interesses amplos ou restritos da sociedade).
A autora afirma categoricamente que, mais do que atribuir rigor absoluto a concepção de política pública, é relevante considerar seu caráter político. Como política pública, a política social carece ser compreendida em sua dimensão política e histórica. E tais dimensões quando articuladas é que se pode progredir mais e mais na definição de política social e na caracterização de seu objeto.
Um dos objetos da política social são as lutas sociais (se não o único), pois não há política social se não estiver diretamente relacionada às lutas da sociedade. Dessa forma, o Estado adota algumas dessas reivindicações populares, transformando-as em políticas sociais ao longo da história, e elas passam a se configurarem como direitos sociais (dizem respeito inicialmente à consagração jurídica de reivindicações dos trabalhadores), como afirma Piana (2009).
Desse modo, a divergência do conceito de políticas sociais continua. Para o próprio Faleiros (1991 apud PIANA, 2009), as políticas sociais se caracterizam de acordo com a posição do grupo representativo, se dominante ou dominado, se governo ou povo. Na verdade, o que queremos aqui apresentar é que as políticas sociais como política pública é direito de todo e qualquer cidadão pertencente àquela nação. Direito como uma categoria que lhe confere o ordenamento jurídico.
Quando falamos de direitos, o Capítulo II da Constituição Federal (CF) de 1988 foi reservado para os direitos sociais, e nele se encontra o Artigo 6o que trata de todos os direitos sociais que os brasileiros têm direito, como: “[…] educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição” (BRASIL, 1988). Portanto, as políticas sociais que subentendem serem políticas públicas, congrega toda e qualquer ação governamental para atender aos direitos sociais da população, em especial, o direito à educação.