O papel do aluno
Nesta sessão abordaremos atitudes essenciais que dependem exclusivamente do estudante, sujeito da aprendizagem, para alcançar o seu objetivo. Abordaremos questões como a autonomia, comunicação e reflexão e a construção coletiva do conhecimento.
Autonomia
Será que todos nós conseguimos aprender a distância? Este é um questionamento válido quando está em jogo atitudes individuais como autonomia, disciplina e comprometimento.
Retomemos à “Mapeamento das competências mínimas necessárias para os papéis de professor, tutor e aluno”. Notem que a primeira competência exigida ao aluno é a organização. Organizar-se para o alcance de um objetivo denota responsabilizar-se pela sua atividade, o que significa cumprir a parte que lhe cabe no processo ensino-aprendizagem, ou seja, ler o material, fazer os exercícios, interagir nos fóruns de discussão, fazer as avaliações, atividades mínimas que o despertarão para a construção do conhecimento.
A segunda é disponibilizar tempo para se dedicar aos estudos. O aluno disciplinado irá reservar de 2 a 3 horas por dia para se desincumbir da tarefa, no horário que mais lhe interessar, sendo esta uma das grandes vantagens da EAD (flexibilidade e liberdade).
Mas é preciso demonstrar persistência e perseverança diante das dificuldades de estudo. O aluno, neste caso, buscará na sua autonomia, inclusive sendo proativo ao buscar contato com o seu tutor/professor para elucidar suas dúvidas.
E por fim e como consequência, se comprometer com o que ele escolheu. Comprometer-se significa dedicação, seriedade, cumprimento de cronograma e disciplina. A alternativa de estudar a distância está posta e apresenta inúmeras vantagens, mas construir uma autonomia de aprendizado não é nada fácil. Se o aluno não colocar esta questão em perspectiva, dificilmente terá sucesso em seu processo de aprendizagem.
Para discorrer sobre autonomia tomemos recortes do texto do professor Antônio Carlos Ribeiro da Silva, professor da Faculdade de Ciências Contábeis – UFBA, intitulado Educação a Distância e o seu Grande Desafio: o aluno como sujeito de sua própria aprendizagem.
“Em oposição a uma prática conservadora, tradicional e tecnicista surge a aprendizagem autônoma, tema que de início sugere três questionamentos:
Respondendo à primeira pergunta carecemos de definir o que é autonomia, que agora é bastante utilizada, significando no verbete da nossa língua “faculdade que tem o indivíduo de governar, de se decidir.” Transportando-se para a aprendizagem autônoma, está implícito que, nesse processo o aluno deve ser responsável pela sua aprendizagem, o que não está subentendido a eliminação do professor no gerenciamento de atividade de ensino. No Ensino à Distância essa atitude do aluno é inevitável para desenvolver o seu espaço do aprender, pois, ela é essencialmente autoestudo.
Para saber como o indivíduo aprende, devemos saber como pensa o educador, o ser que somos é um ser em aberto e o educador precisa desenvolver possibilidades de investigação, sair da ideia de senso comum e permitir que o outro aja com a sua singularidade. Pacheco (1996) comenta que o Aprender a aprender é o objetivo mais ambicioso e, ao mesmo tempo irrenunciável da educação escolar – equivale a ser capaz de realizar aprendizagens significativas por si mesmo numa ampla gama de situações e de circunstâncias.
Para o desenvolvimento de uma aprendizagem autônoma, o educador deve, mesmo que seja difícil, mas se for desejável, assumir uma posição de renúncia ao poder oferecido pelo próprio “lugar” de professor – aquela posição que permite a alguém controlar outros, no caso, os alunos.
Galeffi (2002, p. 17) afirma que:
“Só se aprende o que se mostra necessário no pensar-se. Só o necessário pode ser aprendido em seu evento”.
A Segunda questão é de ordem prática e não constitui tarefa difícil de respondê-la, visto que são inúmeras as vantagens da aprendizagem autônoma para o aluno e o professor.
É nesta concepção que HAIDT (1994:61) afirma que:
“quando o professor concebe o aluno como um ser ativo, que fórmula ideias, desenvolve conceitos e resolve problemas de vida prática através de sua atividade mental, construindo, assim, seu próprio conhecimento, sua relação pedagógica muda. Não é mais uma relação unilateral, onde um professor transmite verbalmente conteúdos já prontos a um aluno passivo que o memorize. A utilização dessa alternativa é aconselhável, mesmo que alguns admitam a inexistência de ganhos pedagógicos (o que não concebemos), pois quando você alimenta no outro a potencialidade de crescimento ele busca sua independência e autoafirmação e a aprendizagem ocorrerá não de forma dicotômica, distante e distorcida, mas pelo contrário, interligada e interdependente com todas as relações significativas mantidas com o aluno.”
A utilização dessa alternativa é aconselhável, mesmo que alguns admitam a inexistência de ganhos pedagógicos (o que não concebemos), pois quando você alimenta no outro a potencialidade de crescimento ele busca sua independência e autoafirmação e a aprendizagem ocorrerá não de forma dicotômica, distante e distorcida, mas pelo contrário, interligada e interdependente com todas as relações significativas mantidas com o aluno.
Essas questões nos remetem a uma reflexão da necessidade de uma intervenção pedagógica construtivista propiciando nos educandos condições adequadas para que os esquemas de conhecimento, construídos pelos alunos, sejam os mais corretos e o professor não deve ficar na posição de mero transmissor de conhecimentos, pois no EaD esse modelo é obsoleto, pois sua característica básica é a não convencionalidade em relação à sala de aula, das dimensões espacial e temporal e da relação professor-aluno…
Esse poderia ser um caminho para melhoria do ensino brasileiro. Trabalhar a autonomia do ato de aprender independente de modalidade de ensino, proporcionar, na verdade, uma formação de indivíduos autônomo, crítico e criativo. Um cidadão que não pense de forma fragmentada, mas de forma global e sistematizada, só assim seremos sujeitos de nossa própria aprendizagem”.
Comunicação /Reflexão
Na Educação a Distância, o acesso a ferramentas multimidiáticas permitindo o desenvolvimento da interatividade desenvolve no aluno a visão crítica imediata (em função do feedback), a possibilidade de acesso instantâneo a um enorme volume de materiais, à estrutura não-linear do material didático, aos indicadores de progresso on-line, à possibilidade de repetição (quantas vezes for necessário).
Professora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Kátia Duarte nos presenteia com o artigo: encontros e desencontros na formação aluno e do professor na Educação a Distância. Conforme a professora, ao longo de um curso, os alunos interagem e aprendem. Realizam atividades de forma individual e coletiva, apropriando conhecimentos e realizando trocas. O processo de apropriação (sendo individual) é favorecido pela interação e pela interatividade entre os integrantes do processo (conteúdo, professor, tutor e demais colegas). É o momento da reflexão, da organização das ideias, da produção. Enquanto é externalizado o conhecimento, o aluno se torna coautor (na elaboração das tarefas, por exemplo).
A externalização do conhecimento, seja de forma dialógica, nos fóruns temáticos, seja nos trabalhos individuais e/ou coletivos, permite que o aluno desenvolva sua capacidade crítica-reflexiva, condição essencial para o sucesso do aprendizado em EAD. Esta, segundo a “Mapeamento das competências mínimas necessárias para os papéis de professor, tutor e aluno”, é o segundo drive de competência exigida do aluno de EAD.
Não basta só esforço do professor/tutor instigando a participação no debate, mas o aluno deve ter uma atitude proativa se sensibilizando para a troca de ideias e conhecimento.
Segundo Aretio (1996, apud DUARTE), a idade média do aluno de EAD está na faixa de 25-50 anos, portanto adultos que decidem por uma educação continuada. São indivíduos que já têm seus projetos de vida pessoais e sociais bem estabelecidos, e é em relação a eles que buscam o aprendizado; possuem interesses de adultos: ocupação, bem-estar, ascensão social e profissional, família e autoestima; normalmente, têm objetivos claros e concretos, valorizados e atuais de aprendizagem; a motivação para o estudo é espontânea, intensa e persistente; têm muita vontade de aprender com as situações escolares. Mas, em função do comportamento psicológico dos jovens adultos e adultos, Aretio (1996 apud DUARTE), ressalta que existem dificuldades que influenciam na aprendizagem do adulto: a insaciável curiosidade da infância, por conhecer coisas novas, diminui; a inteligência pode estagnar-se e a memória tende a diminuir; há decréscimo na rapidez de reação e das atitudes sensoriais e perceptivas; a aprendizagem tende a ser mais lenta do que em idades anteriores, sobretudo quando se refere à mudança de hábitos já consolidados; o cansaço e a escassez de tempo para dedicar-se ao esforço intelectual.
Por tanto, o planejamento de um curso EAD deve considerar o perfil de seus estudantes para que a interatividade possa se fazer presente. Para Resnick (1991, apud DUARTE), a aprendizagem é, antes de tudo, um processo social em que interações com o outro desempenham papel fundamental. A apresentação de um caso e sua análise ou a apresentação de um problema para se resolver são, também, estratégias, a partir das quais o grupo pode analisar conceitos e procedimentos, chegando a situações de aprendizagem significativas.
Vale a pena lançar mão de Kensky (2003, p.119) a respeito da comunicação no ensino mediado pelas tecnologias.
Acredito que os processos de interação social e de comunicação são inerentes às atividades de ensinar. Estes processos não terminam ou se deterioram à medida que uma nova e fenomenal tecnologia surge. Pelo contrário, mesmo com tanto oferecimento de informações nas redes, com o aumento da velocidade das interações na web, ainda assim as pessoas se intercomunicam, trocam ideias e informações principalmente pela fala (linguagem oral) de ensino, é inerente ao ser humano se comunicar. E as novas tecnologias dissipam a barreira da distância e do tempo para que se promova uma comunicação (linguagem escrita) muito mais dinâmica. O aluno que põe em perspectiva este fato estará, por seu turno, abrindo oportunidades maiores para o processo de aprender.
Construção coletiva do conhecimento
É ainda extraída de Kensky (2003, p.126) a importância dos trabalhos colaborativos.
Nos cursos semipresenciais e a distância as formas cooperativas e colaborativas de ensino baseadas no ambiente virtual podem ser utilizadas na maioria das atividades. Buscas temáticas on-line, fóruns, chats e muitos outros trabalhos diferenciados podem ser feitos tendo como meta a interação e a comunicação entre todos os participantes. A utilização cada vez mais frequente de trabalhos em grupo via redes foi possibilitada após o desenvolvimento de vários softwares de produção escrita coletiva, como Wikis e Google Docs.
Orientadas pelo princípio da inteligência coletiva (termo criado por Pierre Levy), as atividades colaborativas de ensino correspondem “a reunião em sinergia dos saberes, das imaginações, das energias espirituais… de um grupo humano constituído como comunidade virtual” (KENSKY,2003, p.126 apud LÈVY,1999, p.130).
Lendo Kerckhove (KENSKY 2003, p.126), Kensky acrescenta informações para definir seu conceito de inteligências em conexão. Para o autor, a inteligência partilhada não é realmente “coletiva”, mas conectada. Para ele, a convergência do hipertexto, multimídia, realidade virtual, redes neurais etc., está nos nossos modos de comunicação, entretenimentos e trabalho. A Internet nos dá acesso a um entorno real, quase orgânico, de milhões de inteligências humanas perpetuamente trabalhando em algo e em muitas coisas que têm sempre uma relevância potencial para qualquer um e para todos os outros.
E segundo Kensky, o conceito de webness caminha ao encontro do conceito de aprendizagem colaborativa. “Nas comunidades virtuais em que vigoram os princípios da aprendizagem colaborativa, cada membro do grupo é responsável pela sua aprendizagem e a aprendizagem dos demais participantes” (KENSKY 2003, p.126). Portanto, o conhecimento é visto como uma construção social e não individual e é por isso que os ambientes educacionais que propiciam a interação e a colaboração são ricos em possibilidades de crescimento do grupo.
Pesquisadores da Universidade de Évora (Portugal) que estudaram a aprendizagem colaborativa desenvolveram um quadro comparativo das principais diferenças entre a aprendizagem tradicional e a aprendizagem colaborativa.
Máximas sobre a aprendizagem tradicional |
Máximas sobre a aprendizagem colaborativa |
Sala de aula |
Ambiente de aprendizagem (AVA) |
Professor autoridade |
Professor orientador |
Centrada no professor |
Centrada no aluno |
Aluno – Uma garrafa a encher |
Aluno – Uma lâmpada a iluminar |
Reativa, passiva |
Proativa, investigativa |
Ênfase no produto |
Ênfase no processo |
Aprendizagem em solidão |
Aprendizagem em grupo |
Memorização |
Transformação |
Principais diferenças entre a Aprendizagem Tradicional e a Aprendizagem Colaborativa Fonte: KENSKY, 2003, p.127.
Em seguida, Kensky apresenta os elementos básicos de aprendizagem colaborativa de acordo com a pesquisa de Évora:
- “A interdependência do grupo. Os alunos, como um grupo, têm um mesmo objetivo a perseguir e devem trabalhar eficazmente em conjunto para alcançá-lo. Primeiro, os alunos são responsáveis pela sua própria aprendizagem (grifo nosso). Segundo, por facilitar a aprendizagem de todos os membros do grupo. Terceiro, por facilitar a aprendizagem de alunos de outros grupos. Todos os alunos interagem e todos contribuem para o êxito da atividade”.
- “A interação. Um dos objetivos da aprendizagem colaborativa é o de melhorar competência dos alunos para trabalhar em equipe”.
- “O pensamento divergente. Não deve haver nenhum elemento do grupo que se posicione ostensivamente como líder ou como elemento mais “esperto”, mas uma tomada de consciência que todos podem pôr em comum as suas perspectivas, competências e base de conhecimentos. As atividades devem ser elaboradas de modo que exijam colaboração em vez de competição (tarefas complexas e com necessidade de pensamento divergente e criativo)”.
Tal análise vem ao encontro do drive comunicação, atitude esperada pelo aluno EAD. Uma atitude proativa, investigativa, curiosa, e com desejo de partilhar suas descobertas, enriquecerá o processo de aprendizagem do aluno EAD.
Para finalizar deixamos uma citação da professora Vani Kensky, especialista nesta área:
É participando, colaborando, reconhecendo e sendo reconhecido pelos seus pares, que a pessoa que atua intensamente da comunidade virtual sente o seu poder, desenvolve suas potencialidades comunicacionais, libera seus talentos. Mais ainda, socialmente integrada na equipe, a pessoa dimensiona sua participação de acordo com os valores e regras em jogo, realiza trocas e aprende muito mais do que o foco específico de seu interesse. Aprende a conviver em grupo, a colaborar e respeitar as pessoas, a falar e a ouvir (ainda que, na maioria das vezes, ocorram apenas intercâmbios escritos), a superar conflitos, expor opiniões, trabalhar com pessoas que não conhece presencialmente, mas com as quais se identifica no plano dos interesses e ideias.” (KENSKY 2003, p.129)
Síntese: Item O papel do aluno em EAD: Autonomia, comprometimento e disciplina são atitudes que se requer do aluno para que ele consiga desenvolver a competência da aprendizagem com base na reflexão e na colaboração.
Fim da Aula 07